por Joel Rennó Jr.
Estudo diz que 71% das pessoas que sofrem com o pânico são mulheres.
Hoje muito se fala da Síndrome do Pânico (SP) ou Transtorno do Pânico (TP), porém, em muitos meios, isso passa despercebido, levando todos a procurarem cardiologistas, clínicos gerais e outros profissionais na tentativa de buscar-se uma explicação lógica para uma série de sintomas físicos que ocorrem associados a esse transtorno mental.
Repentinamente, o coração dispara vindo acompanhado de tontura e falta de ar. Um terrível sentimento de morte iminente sufoca o âmago do paciente. Cerca de 20 a 30 minutos depois, tal estado de extrema ansiedade pode desaparecer. As pessoas ficam atormentadas apenas pela expectativa de que uma outra crise aterrorizante possa ocorrer sem avisar e com a pessoa totalmente indefesa ou vulnerável. É como se ela se sentisse ameaçada o tempo todo, com algo terrível e prestes a acontecer, sem que ela possa prevenir.
A prevalência ao longo da vida, segundo dados do National Comorbidity Survey (NCS) dos EUA, é de cerca de 3,5%. Tal estudo detectou também, nas pessoas com pânico, que 71% delas eram do sexo feminino, enquanto 29% eram do sexo masculino. A idade de início da sintomatologia se concentra entre os 15 e 19 anos, sendo raro os casos que se iniciam após os 40 anos.
No Brasil, deve haver entre quatro a seis milhões de pessoas que sofrem com esse distúrbio. Segundo a pesquisadora norte-americana Yonkers, da Universidade de Yale (EUA), ao longo de oito anos, após a completa interrupção dos sintomas, as mulheres têm uma chance de recaída de 64%, enquanto os homens de 21%. Já a remissão (diminuição ou interrupção) dos sintomas, neste período é de 76% para as mulheres e de 69% para os homens.
*Tempo de cura
A cura depende de uma série de fatores biológicos e psicossociais individuais que serão trabalhados adequadamente pelo especialista. Geralmente, o tempo mínimo para a recuperação plena é em torno de 6 a 12 semanas, mas repito, não há regras, depende da resposta individual à psicoterapia, medicação específica, da própria gravidade sintomatológica e da evolução da doença que é variável.
*Sintomas
Os sintomas de pânico mais associados ao gênero feminino são respiração curta, náusea e sensação de sufocamento. Já no sexo masculino, os sintomas mais comuns costumam ser sudorese profusa e mal-estar ou dor estomacal. As mulheres costumam ter mais associação com quadros fóbicos e até transtorno do estresse pós-traumático ou depressão. Geralmente, os pensamentos catastróficos também são mais típicos no sexo feminino, segundo as diversas pesquisas.
O Transtorno do Pânico é caracterizado pela presença repetitiva de ataques de pânico: crises espontâneas, súbitas, de mal-estar e sensação de perigo ou morte iminente, com vários sintomas e sinais de alerta como suor, tremores, rubor facial, taquicardia ("batedeira no coração"), taquipnéia (respiração rápida e superficial), sensação de sufocamento ou "nó na garganta", tonturas, formigamentos, náuseas, vômitos, diarréias e outros, atingindo o pico máximo em cerca de 10 minutos.
As crises de pânico podem levar ao comportamento desadaptativo e congelamento ou busca de fuga ou ajuda (ida a um pronto-socorro) que denominamos pânico.
Geralmente, a pessoa está bem quando percebe que algo indefinido a ameaça. Ocorre uma sensação inesperada de falta de ar, tonteira, flutuação que indicam um risco de vida ou perda da razão que nunca chegam a ocorrer. As mãos gelam e ficam úmidas, a respiração fica difícil, o coração acelera e a pessoa sente-se sufocada. Formigam as extremidades, adormecem os lábios e ondas de calor ou frio ocorrem também. Tudo ocorre em segundos ou minutos. O indivíduo procura ajuda e pode se desesperar. A crise pode passar em cerca de 20 a 40 minutos e é seguida de sensação de cansaço, fraqueza, pernas bambas. No auge da crise, a pessoa pode tomar atitudes de risco como descer do carro em locais de risco, abandonar afazeres domésticos sem os devidos cuidados (como apagar o fogo por exemplo).
As crises de pânico geram muita insegurança e medo. Por isso, levam ao receio de novos ataques, a chamada ansiedade antecipatória. Com isso, as pessoas tendem a se isolar e apresentar a fobia, ou seja, um medo persistente, irracional e intenso de determinadas situações ou contextos sociais.
Interessante também notarmos que as pacientes com pânico têm uma maior taxa de desemprego (59%) contra 31% do sexo masculino, ou seja, o impacto profissional negativo é mais proeminente nas mulheres. A agorafobia (medo de lugares amplos, com muitas pessoas) também é bem mais freqüente no sexo feminino.
*Fatores genéticos
Fatores genéticos certamente contribuem para a sua causalidade visto que 35% dos parentes de primeiro grau de pacientes com Transtorno do Pânico sofrem do mesmo problema, entretanto, isso não deve ser suficiente para a eclosão da Síndrome do Pânico. Há vários modelos explicativos, como os metabólicos (relacionados ao funcionamento do organismo, com a produção de determinadas substâncias químicas) e os neuroquímicos (alterações nos sistemas de neurotransmissores cerebrais como a serotonina, a noradrenalina e, mais recentemente, o glutamato e o óxido nítrico, ou seja, substâncias químicas cerebrais que comunicam as células nervosas), embora nenhuma causa isolada tenha sido determinada.
Outra hipótese é também uma possível disfunção no sistema de alerta do organismo, para situações vivenciais, imaginárias ou reais, potencialmente perigosas e que causam medo, formado pelas projeções do sistema límbico (que rege as emoções e cujo componente mais importante é a amídala) para o hipotálamo e tronco encefálico, controlando todas as respostas do sistema nervoso autonômico.
Deve-se diferenciar o Transtorno do Pânico de doenças físicas como as cardiológicas, pulmonares, endocrinológicas ou neurológicas. Há associação com prolapso valvar mitral (problema de válvula do coração), hipertireoidismo (excesso de funcionamento da glândula tireóide), hipoglicemia (açúcar baixo no sangue) e síndromes vertiginosas (referentes a tonturas).
*Tratamento
O tratamento deve incluir a medicação antidepressiva e a psicoterapia, preferencialmente, a *cognitivo-comportamental, sendo realizado por médicos psiquiatras auxiliados por profissionais da psicologia. Tratamentos alternativos não têm eficácia ou comprovação científica. Não é uma questão de esforço ou força de vontade, temos uma doença de base biopsicossocial bem estabelecida.
Precisamos pesquisar quais são os fatores emocionais que mais sensibilizam os pacientes para preveni-los. As questões ambientais também precisam ser reestruturadas, ou seja, a forma como as pessoas se adaptam às transformações sociais.
No mundo atual, não adianta querermos, utopicamente, eliminar os fatores estressores. Temos, sim, que mudar a forma como as pessoas lidam com os mesmos e o valor que lhes atribuem. É muito comum haver, um ano antes da crise de pânico, a perda de suporte social, mais especificamente, de um amigo ou parente. Em breve, teremos novas medicações que atuem em mecanismos diferentes aos das medicações atuais, agindo sobre novos neurotransmissores envolvidos na gênese do transtorno do pânico como o óxido nítrico e o glutamato, descobertos recentemente.
Concluindo, o paciente com transtorno do pânico não deve ter receio ou medo de procurar o psiquiatra, que é o médico especialista correto para tal tratamento, devido aos seus preconceitos e crenças, pois, dessa forma, estará impedindo um tratamento eficaz e adequado para livrá-lo de seu grande sofrimento e incapacitação.
A doença não tratada afeta e gera sofrimento intenso ao indivíduo e familiares envolvidos. Depoimentos ou testemunhos construtivos de famosos que já sofreram do transtorno e o superaram como Roberta Miranda, Clodovil, Sabrina Parlatore, Fernanda Lima e Ronaldo Ésper, entre tantos, podem ter uma função social relevante. Toda a sociedade precisa se unir nesse sentido.
*Terapia cognitivo-comportamental é uma das linhas de psicoterapia. Visa mudanças práticas de comportamentos patológicos associados à doença, como sensação de perigo perante algumas situações ou locais. Por exemplo, paciente com pânico que evita locais abertos e com grande número de pessoas, porque associa tais locais às crises e tem medo de não ser socorrido a tempo, caso passe mal.
Joel Rennó Jr.
Doutor em Psiquiatria pela Faculdade de Medicina da USP. Coordenador do Projeto de Atenção à Saúde Mental da Mulher-Instituto de Psiquiatria do Hospital das Clínicas da FMUSP. Médico do Corpo Clínico do Hospital Israelita Albert Einstein-SP (HIAE)
Nenhum comentário:
Postar um comentário